OS VALORES QUE COMPÕE OS 70% DA FOLHA DE PAGAMENTO DO PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL

PARECER

ASSUNTO: trata-se de consulta formulada pelo Presidente da ABRACAM – Associação Brasileira de Câmaras Municipais, acerca das despesas que compõe o limite de 70% com gasto de pessoal, no âmbito do Poder Legislativo, com atenção especial para os gastos relativos às contribuições patronais (regime próprio e INSS).

                                Inicialmente, e para um melhor entendimento da questão, vale trazer à colação o que dispõe a Constituição Federal acerca do assunto:

Art.  29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5o do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior: 

I – 7% (sete por cento) para Municípios com população de até 100.000 (cem mil) habitantes;  

II – 6% (seis por cento) para Municípios com população entre 100.000 (cem mil) e 300.000 (trezentos mil) habitantes; 

III – 5% (cinco por cento) para Municípios com população entre 300.001 (trezentos mil e um) e 500.000 (quinhentos mil) habitantes; 

IV – 4,5% (quatro inteiros e cinco décimos por cento) para Municípios com população entre 500.001 (quinhentos mil e um) e 3.000.000 (três milhões) de habitantes; 

V – 4% (quatro por cento) para Municípios com população entre 3.000.001 (três milhões e um) e 8.000.000 (oito milhões) de habitantes; 

VI – 3,5% (três inteiros e cinco décimos por cento) para Municípios com população acima de 8.000.001 (oito milhões e um) habitantes. 

§ 1o  A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores. 

                                Diante do texto constitucional e dos termos da consulta, nos ateremos ao limite previsto no §1º, do artigo 29-A, da Constituição Federal, que trata do limite mensal de gasto com pessoal, na ordem de até 70% (setenta por cento) do duodécimo.

                                Antes, porém, de adentrarmos no mérito da consulta propriamente dita, necessário se faz também estabelecer a distinção entre os dispositivos constitucionais e aqueles insertos na Lei Complementar 101/2000 – Lei de Responsabilidade Civil, que dispõe da seguinte forma, acerca da despesa total com pessoal:

Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total de pessoal: o somatório dos gastos do ente da federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

§1º Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como “Outras Despesas de Pessoal”.

§2º A despesa total com pessoal será apurada somando-se a realizada no mês de referência com as dos onze imediatamente anteriores, adotando-se o regime de competência. (grifei).

                                Verifica-se pela simples leitura dos dispositivos colacionados alhures, que as matérias tratadas por um e por outro, são distintas e os conceitos não se confundem, pois enquanto o §1º, do art. 29-A, da Constituição Federal trata da folha de pagamento, e tão somente da folha de pagamento, para estabelecer o limite de gastos do legislativo municipal com pessoalem 70% (setenta por cento) do duodécimo, a Lei infraconstitucional (LRF) versa acerca do gasto total com pessoal do ente federativo, no caso, o MUNICÍPIO, levando-se em consideração a receita corrente líquida, em relação ao mês de apuração, somado aos 11 (onze) meses imediatamente anteriores.

                                Como forma de elucidar ainda mais essa celeuma, necessário se faz trazer à colação, o disposto nos artigos 19 e 20 da LRF, in verbis:

Art.19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

            (…)

III – Municípios: 60% (sessenta por cento).

            (…)

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

            (…)

III – na esfera municipal:

a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;

b) 54% (cinquenta e quatro por cento) para o Executivo.

(…)

                                      Para clarificar ainda mais essa situação, vale a pena trazer à baila o que dispõe o artigo 169, da Constituição Federal, que ensejou o surgimento dos dispositivos supracitados no bojo da LRF, in verbis:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

                                Tais limites de que trata o artigo 169, da CRFB, observem, são os limites insertos em Lei Complementar, não em outro artigo da Constituição Federal. Portanto, trata-se do limite estabelecido para despesa total com pessoal, no âmbito municipal, que é de 60% (sessenta por cento) da receita corrente líquida, sendo 54% (cinquenta e quatro por cento) para o Executivo e 6% (seis por cento) para o Legislativo.

                                Há de se observar que não há conflito entre os dispositivos, por tratar-se de situações e previsões diversas. Um texto não contradiz o outro, muito pelo contrário, ambos são formas diversas de controle dos gastos públicos e se complementam por este motivo.

                                O Artigo 29-A, §1º, da Constituição da República Federativa do Brasil, limita o gasto do Poder Legislativo com a sua “folha de pagamento”, incluindo o subsídio dos Vereadores, em 70% (setenta por cento), levando em conta o seu duodécimo, que é composto pelas receitas tributárias e transferências previstas no §5º, do artigo. 153 e nos artigos 158 e 159 da Constituição Federal, realizadas no exercício anterior, além dos impostos municipais, taxas, contribuições de melhoria e a dívida ativa tributária, acrescida de multas e juros de mora.

                                É inconteste de dúvidas que o limite de 70% com gasto de pessoal, imposto pelo artigo 29-A, §1º, da CRFB de 1988, cinge-se às despesas decorrentes da folha de pagamento dos servidores do Poder Legislativo e dos Vereadores, excluindo-se todo em qualquer gasto adjacente, inclusive contribuições previdenciárias e encargos sociais, conforme entendimento unânime dos Tribunais de Contas Brasil afora, conforme veremos a seguir:

TCE-MG:

SÚMULA 100 (MODIFICADA NO D.O.C. DE 05/05/11 – PÁG. 10 – MANTIDA NOD.O.C. DE 07/04/14 – PÁG. 04)

A folha de pagamento da Câmara Municipal, incluindo o gasto com o subsídio deseus Vereadores, para fins de apuração do limite preceituado no § 1º do art. 29-Ada Constituição da República, não compreende os gastos com inativos, os encargossociais e as contribuições patronais.

REFERÊNCIA NORMATIVA:Art. 225 da Resolução do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais nº 12, de 17/12/08.Redação Anterior (Revisada no “MG” de 26/11/08 – pág.72).

A folha de pagamento do pessoal da Câmara Municipal, incluído o subsídio dosVereadores, não alcança os encargos sociais.Redação Anterior (Publicada no “MG” de 26/11/03 – pág.58)

A folha de pagamento do pessoal da Câmara Municipal, incluído o subsídio dosvereadores, à que se refere o § 1º do art. 29-A da Constituição da República de1988, não alcança os encargos sociais, não podendo ser reduzidos isoladamentepelo gestor.

REFERÊNCIAS NORMATIVAS:

– Art. 29-A, § 1º da Constituição da República de 1988;

– Art. 18 da Lei Complementar Federal nº 101, de 04/05/00;

– Art. 125 da Resolução do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais nº 10, de

03/07/96 – revogada.

PRECEDENTE:

– Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 655.804, sessão de 21/11/01.

TCE-MG

[Encargos sociais e previdenciários] (…) uniformizou-se o entendimento deste Tribunal de Contas, por seis votos a um, de que as despesas com encargos sociais e previdenciários patronais de câmaras de vereadores não se incluem no limite de 70% previsto no § 1º do art. 29-A da vigente Constituição da República, dispositivo acrescido ao texto magno pela Emenda Constitucional nº 25 (…). Como é sabido, o citado dispositivo limita a despesa com folha de pagamento da Câmara Municipal, incluídos os subsídios dos vereadores, a 70% de sua receita, ou melhor, dos recursos que lhe forem transferidos pelo Executivo. Trata-se de limitação imposta a despesas de caráter remuneratório de servidores da edilidade, incluídas aquelas com os subsídios dos edis. Nessa esteira, como as diárias têm natureza indenizatória, pois visam atender às despesas extraordinárias de alimentação e pousada de agentes públicos durante o seu afastamento do local onde servem, por motivo de serviço, os valores pagos a esse título não devem ser computados para aferição do limite acima referido (Consulta n. 652408. Rel. Cons. Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 06/11/2002).

TCE-MG

[Folha de pessoal. Limite de gastos do Legislativo municipal] (…) as normas do art. 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal são definidoras de tudo aquilo que um ente da Federação (…) pode despender com despesa de pessoal. (…) o art. 29-A, no § 1º, trata daquilo que o Legislativo pode despender com o pagamento da folha de pessoal, servidores e vereadores e, no caput, define tudo que o Legislativo pode gastar, somando todas as despesas de pessoal, isto é, ele não pode comprometer, se for ummunicípio de até 100 mil habitantes, mais de 70% dos 8% com o pagamento da folha. E, em pagamento da folha, está incluída apenas a remuneração do pessoal da ativa (Consulta n. 638443. Rel. Cons. Sylo Costa. Sessão do dia 24/04/2002).

                                O TCE/MG, inclusive, sumulou essa questão, estatuindo que:

ENUNCIADO DE SÚMULA N. 100. A folha de pagamento da Câmara Municipal, incluindo o gasto com o subsídio de seus vereadores, para fins de apuração do limite preceituado no § 1º do art. 29-A da Constituição da República, não compreende os gastos com inativos, os encargos sociais e as contribuições patronais.

                                Cumpre destacar que embora o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro não disponibilize suas decisões, enunciados e súmulas na internet, devido a nossa mediana atuação e experiência nesse meio, conseguimos alguns documentos que traduzem o posicionamento desse órgão colegiado, no que se refere à composição do limite de gasto previsto no §1º, do artigo 29-A, da CRFB de 1988, na ordem de até 70% (setenta por cento) da receita – da Câmara – com a folha de pagamento.

                                Tais esclarecimentos evidenciam que os nossos legisladores se preocuparam muito em delimitar os gastos públicos com pessoal, seja por parte do Município como um todo, seja por parte do Município isoladamente ou, por fim, seja por parte do Poder Legislativo, impondo limites para tais gastos tanto na Constituição Federal, quanto na legislação infraconstitucional, conforme pode-se verificar da análise do processo TCE/RJ n. 217.951-8/2009, que trata da prestação de contas de ordenador de despesa do Município de Laje do Muriaé/RJ, in verbis:

  1. GASTOS COM PESSOAL

Para efeito de cálculo, consideramos como despesa total com pessoal o somatório dos gastos com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros do poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas-extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência. Compõem também esta base de cálculo os contratos de terceirização de mão-de-obra que se refiram à substituição de servidores e empregados públicos que, nesse caso, são contabilizados como “outras despesas de pessoal” – artigo 18 da Lei Complementar Federal n.º 101/00 – decorrentes de contrato de terceirização, conforme Portaria Interministerial n.º 163/01 e suas posteriores alterações.

Considerando que a apuração dos gastos de pessoal se faz quadrimestral e semestralmente, sendo, inclusive, a não observância aos percentuais motivo de alerta nos Relatórios de Gestão Fiscal, na forma do §1º do art. 59 da Lei Complementar Federal n.º 101/00, iremos nos ater à transcrição dos dados cuja trajetória se deu nos exercícios de 2007 e 2008, registrados nos respectivos Demonstrativos da Despesa com Pessoal – Anexo I do RGF – conforme demonstramos:

Percentual aplicado com Pessoal: Poder Legislativo

Em%

2007:

1º Semestre: 4,43

2º Semestre: 4,08

2008:

1º Quadrimestre: 4,08

2º quadrimestre: 3,81

3º Quadrimestre: 3,64

Conforme podemos constatar, o Poder Legislativo respeitou o limite estabelecido no artigo 19 c/c o art. 20 da LRF, no exercício de 2008.

  1. VERIFICAÇÃO QUANTO AO CUMPRIMENTO DO ARTIGO 29-A DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL/88

(…)

Não nos interessa.

  1. Verificação do Cumprimento do §1º do Artigo 29-A, da CF/88 –

Observamos que, em 2008, a despesa com a folha de pagamentos da Câmara Municipal, em relação ao repasse permitido encontrado no tópico anterior, acha-se abaixo do limite de 70%, havendo o cumprimento do determinado no §1º do art. 29-A da Constituição Federal, conforme se demonstra:

DESCRIÇÃO VALOR (R$)
REPASSE PERMITIDO PARA A CÂMARA NO EXERCÍCIO DE 2008   894.006,92
LIMITE PARA GASTO COM A FOLHA DE PAGAMENTO DO LEGISLATIVO (70%)   625.804,85
GASTOS COM FOLHA DE PAGAMENTO (*)   584.160,15
VENCIMENTOS E VANTAGENS FIXAS – PESSOAL CIVIL   575.640,15
SALÁRIO FAMÍLIA 8.520,00  
GASTOS COM SERVIÇOS DE TERCEIROS EM SUBSTITUIÇÃO A SERVIDOR   0,00
SESSÕES EXTRAORDINÁRIAS REALIZADAS FORA DE RECESSO LEGISLATIVO   0,00
(D) TOTAL DO GASTO ACIMA DO LIMITE (C-B) 0,00

                                      Há de se observar pela simples visualização dos números lançados para a apuração do limite inserto no §1º, do artigo 29-A, da Constituição da República Federativa do Brasil, que constam apenas os valores que compõe a folha de pagamento propriamente dita, sem encargos financeiros e contribuições previdenciárias.

                                Observe, ainda, que o único incremento destacado da folha de pagamento para mostrar que ele é elemento intrínseco da folha e, portanto, faz parte da composição dos valores para efeitos de apuração do limite de 70% (setenta por cento), é o salário família que, na mesma planilha, os técnicos do órgão de controle fizeram questão de soma-lo aos vencimentos e vantagens fixas (pessoal civil), com a finalidade de chegar ao somatório final da folha de pagamento, único elemento considerado pelo TCE/RJ e por todos os demais TCE’s, para efeitos de apuração do limite de 70% (setenta por cento), previsto no artigo 29-A, §1º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988.

                                Como se pode notar a Constituição Federal versa acerca da folha de pagamento, para estabelecer o limite de gastos com pessoal em até 70% (setenta por cento) de sua receita. Por outro lado, o art. 18, da LRF preconiza o que é despesa total com pessoale, em seus arts. 19 e 20, estabelece os limites de gastos com esse item vinculado à receita corrente líquida e não ao duodécimo percebido, mensalmente, pela Câmara Municipal.

                    Destarte, feitas as elucidações necessárias, delimitando os campos de incidência e apuração dos limites previstos na legislação constitucional (CRFB, 1988) e infraconstitucional (LRF), pode-se definir que para efeito do disposto no §1º, do art. 29-A, da CF/88, a composição da folha de pagamento não inclui outras despesas senão aquelas exclusivamente relacionadas ao pagamento da remuneração dos servidores e dos subsídios dos Vereadores, excluindo-se os encargos previdenciários patronais, os gastos com inativos e pensionistas (art. 29-A, caput, da CF/88), diárias, ajudas de custo e outras receitas de natureza indenizatória.

                    Este é o Parecer, para análise e apreciação de sua Excelência, o Presidente da Associação Brasileira de Câmaras Municipais – ABRACAM.

São José de Ubá/RJ, 21 de janeiro de 2020.

Hamilton Machado Valeriote Júnior

Advogado – OAB/RJ 143.465

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